Rouco

Por Antonio Fernandes

Aguarde na noite
A ausência do gotejo
Do cotejo do cansaço
o embaraço
De estar vivo quando não deveria estar
atravesse a noite aceso
como a Austrália em chamas
vidrado no teto escuro
E os pensamentos ainda mais
vislumbre a exaustão
A fraqueza mental
de quem tentou
Cortar e queimar tudo
de quem se pôs aos pés
Do mar abaixo o luar
E berrou contra toda a natureza
em plenos pulmões de ódio
Meu Deus
Se eu fosse um general
Marcharia as tropas
contra o próprio oceano
(nao me chame de louco,
Calígula fez primeiro)
Eu entrei
Tudo que havia
quanta ira quanta raiva
Na areia deserta
De uma praia isolada
em plena madrugada
Afastado de toda alma humana
sem sequer luz de civilização
Eu odiei a natureza
por ter me feito eu
por ter me posto aqui
eu odiei Deus
por ter feito cada pedaço torto
deste quebra-cabeça faltando peças
com partes que se mudam
eu odiei o tempo o espaço
Os universos
eu entrei nas ondas e gritei
com meus pulmões sozinho no mundo no escuro no céu
Sem nenhuma estrela de lua forte
Que iluminava pesada ondas fortes que empurravam meus joelhos minha barriga
Eu gritei contra o oceano
eu gritei contra a natureza
Gritei contra as coisas
contra o oceano e a natureza das coisas
Gritei contra todos vocês
Odiei tudo que existe e tem vida
E ainda tudo o que nao tem vida
ou o que já teve e morreu ou tudo que nem nasceu
eu odeio cada párticula do universo
odeio qualquer coisa que exista porque tudo que há está e me causa dor
tamanha que perco o sentido e berro contra o oceano
Quero ir mais fundo
Quero afogar o meu ódio no sal
Quero afogar meu ódio no sal como Sarula
Quando eu terminar o oceano deixará de ser salgado
E será amargo
amargo de um odio assassino de mim por outros e contra tantos
Temperado de dor
berrei contra o oceano
Nao havia nada
Escuridão areia e água
Por milhares de quilômetros
Do outro lado a África
De onde escuto alguém
Gritar de volta
E pra cima eu olho o vazio
Do céu
Infinito sem estrelas
Quanto espaço
Daqui de onde estou
Gritando contra o mar
Gritando contra o céu
Até a outra beirada dos confins do universo
Onde atravessando via lácteas cometas constelações
Planetas bolas incandescentes de Hélio
Lá em qualquer lugar como aqui
Eu escuto qualquer coisa como gente
Gritando qualquer coisa como ódio
De volta
Escuto o grito do oceano
Escuto o grito dos céus
E grito de volta
Nao posso ser o unico sozinho
Numa imensidão tão vazia
A gritar para o nada
Apesar da solidão
Da compreensão de que nenhuma ajuda alcança
O terror que existe dentro da sua própria mente
O terror de ter com pessoas
O terror de ser machucado
O terror de nunca mais confiar em ninguém
Ou ter condições de esperar ser ajudado
Por qualquer coisa que seja
O vazio desse oceano
Contra quem grito
E toda a sua dimensão até a África
É tão grande quanto vazio que existe em mim
E o ódio do meu peito
Ferve como ferve o odio
Do Hélio que carbura explosivo nuclear no centro do Sol
E eu tanto quero mergulhar no mar
Para apagar esse Ódio
Como para apagar a mim mesmo
As ondas me arremessam com violência
E se eu tivesse um exército
Como Calígula
Lançaria contra elas
E contra a natureza
Toda a minha violência
O mau que me causaram é enorme
E tenho me afogado em poesia
Como meus pulmões
Enchem d'água
E me sufocam
Na vida
Haja um oceano inteiro
para apagar essa
chama de raiva
Uivada de dor
sozinho no mar
Deixar que o calor
consome


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