Contemplemos o teto

Por Antonio Fernandes

Sinto um aroma doce
trago um cheiro forte 
De suor e molhado
De lados que se espremem
Escuto seus ganidos
seus miados
urros embriagados
sinto gosto de pele
gosto de cabelos de saliva
de boca
olho como quem observa
como que se estivesse de fora e não dentro
e ainda mais embriagado me torno
quando vejo que sou eu mesmo
a me contemplar no quadro
e o movimentar de corpos que se devoram
e ao mesmo tempo lento e depressa
e ao mesmo tempo forte e fraco
e brinco e rio e arranho
feito um gato
e tu és meu novelo de lã
tateio seus volumes
meto-os na boca
e me divirto com tua face
com tuas expressões de dominado
e quando por ti sou dominado
cresce-me um leão de vontade
sobe-me uma lebre de desespero
não urro um mundo por vaidade
e medo em deixar que os vizinhos escutem
e novamente eu estou no quadro
e analiso-me enquanto contorço-me
já não sou mais de mim
e tu não és mais de ti
Só há um
E é o amor
E estouram os fogos de artifício
Os canhões
Tocam as orquestras as trombetas
Atravessa em trovoada a Cavalaria
e já não são miados mas urros
que se fodam os vizinhos
olhos cerrados ouvidos aterrados
odores encerrados e só há grito
berros e gemidos
e não um nem outro
gozamos os dois
e tu se deita ao meu lado
tanto quanto eu, embriagado
e em sossego, juntos
contemplamos maravilhados
o teto



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