Primeiro Encontro

Por Isabela Azevedo
Original aqui.


Fotografia by Vanessa da Mata on Grooveshark

A gente pode ficar por aqui, nesta esquina. Peça sua cerveja, eu vou no guaraná. E, enquanto nós conversamos, pode livremente fazer seus gestos que dão tantas expressões à sua fala. Pode tocar em mim sem querer ou querendo, mas você quererá que eu saiba que foi sem querer. Fale-me dos seus planos, cite um pedaço de uma música do Tom Jobim e, se eu não souber a qual música se refere, cantarole esse mesmo pedaço para mim. Vamos esticar este papo. Segure minha mão de vez em quando, deixe-me reparar, em silêncio, quão semelhantes nossos dedos são. Deixe-me falar sobre como você fica lindo com cara de quem não entendeu o que o outro está falando. Falarei algo que você não entenda de propósito.

Sorria para mim quando estivermos imersos no silêncio. E, quando dele emergirmos, repare em como eu tomo o fôlego, com dificuldade, para falar quando você está perto. Não repare na minha voz trêmula, continue falando como se nada estivesse acontecendo. Eu amo a sua voz, pode falar a noite toda. Então, nos instantes em que você retoma o seu fôlego, o desejo de me aproximar da sua boca aumentará. Se você sentir esse aumento, se aproxime fingindo que não sentiu nada. E continue falando.

Peça outra cerveja, mas o meu guaraná ainda não acabou. Ofereça-a a mim e ria da minha cara feia enquanto eu provo esse gosto duvidoso. Fale “dois minutinhos” antes de se levantar para ir ao banheiro. Eu vou rir de você andando como quem está apertado para fazer xixi anda. Prometo rir discretamente. Na volta, você virá secando as mãos recém-lavadas na bermuda e, quando se assentar na cadeira que está ao meu lado, perceberá minha saudade (causada pelos dois longos minutos em que esteve a menos de trinta centímetros do meu corpo) só de repousar suas pupilas nas minhas.

Encoste sua perna na minha e mexa-a como quem nada quer, querendo encostar as falanges em meu joelho. Um fio de cabelo meu na sua barba fará com que eu toque o seu rosto para retirá-lo. Sem perceber, tocarei também seus lábios, como se tocasse o teclado mais sensível ao toque. Um sorriso de canto de boca aparecerá no meu rosto e, no seu, um possível franzimento sutil das sobrancelhas, o que demonstrará que você não está entendendo nada, mas, na verdade, tudo já estará entendido. Nos entendemos bem.

E, entre pedaços de pele juntos aqui e pedaços de pele juntos ali, as superfícies de nossas bocas se encontrarão porque irão querer se encontrar. Sua boca será mais macia que sua voz, sua respiração ficará mais ofegante do que fica quando está agitado. Sua mão irá de encontro com a minha nuca que se contorcerá com o encontro da sua mão. Nossas mandíbulas se movimentarão no mesmo ritmo da música Oceano, que ecoará psicologicamente em meus ouvidos. Você me puxará para perto com a mão que não estiver na minha nuca, fará com que eu sinta nossos corações juntos batendo, nossos pulmões trabalhando à mesma velocidade. Inspirará o que eu expiro, expirará o que eu respiro.

De Oceano, o ritmo passará a ser o que você quiser. Neste instante, rendida estarei com minha boca na sua, comigo em você. Perto, juntos, colados, grudados como se qualquer afastamento trouxesse a angústia do querer estar perto de novo. Em seu ouvido direito, escutará “me leve para onde quiser me levar” quando o gosto do seu beijo ficar tão bom que fará com que eu queira descobrir o gosto de ser sua.

Então, a gente não poderá ficar por aqui mesmo, nesta esquina. Roube-me, sequestre-me e esqueça que tudo isso pode ser errado. Se parecer certo e motivador do meu sorriso, eu não ligo. Apenas me leve para onde quiser me levar.






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